Gilberto Gil comenta em documentário sua própria obra no canal Curta !

Gilberto Gil
Gilberto Gil

Há 23 anos dedicando-se a documentar a carreira de Gilberto Gil, o diretor Lula Buarque de Hollanda realiza com Gilberto Gil – Antologia Vol. 1 seu projeto mais pessoal.

Ao longo de 75 minutos, o filme mostra exclusivamente o cantor e compositor baiano. Ora cantando, em registros de época, exclusivamente canções de sua própria autoria, ora comentando, na atualidade, as músicas exibidas.

“É um documentário para devotos de Gilberto Gil”, comenta Lula. Antologia Vol. 1 será lançado nesta segunda (23), às 22h40, no canal Curta!.

A ideia é bastante simples. Vinte canções históricas são apresentadas em diferentes vídeos (programas musicais, shows, clipes), todos registrados na época em que as músicas foram lançadas. Após a exibição, Gil comenta cada canção, trazendo observações interessantes (algumas surpreendentes) sobre músicas como Domingo no parque, Refazenda, Esotérico, Expresso 2222, Aquele abraço. As canções selecionadas vão de 1966 a 1983.

Na semana santa de 1973, Gil, na varanda do apartamento de Chico Buarque, degustava com o amigo doses de Fernet. Esse encontro serviu para amarrar a ideia de uma canção que o baiano tinha começado a gestar naqueles dias. A imagem do Cristo na cruz mais o amargor do vermute serviram de inspiração para Cálice, que os dois lançariam de forma ruidosa em maio daquele ano – no Festival Phono 1973, os microfones de Gil e Chico foram cortados durante a canção, que foi executada sem letra.

Em Antologia, o dueto interrompido de Gil e Chico é seguido da narração a respeito do nascimento da canção. O próprio Lula, que começou a documentar a trajetória do cantor e compositor em Tempo rei (1996), não conhecia a história do Fernet. É dessa maneira que, canção após canção, o filme vai sendo construído.

EMOÇÃO

O diretor não facilita a vida do espectador. Os vídeos não trazem nenhuma referência sobre a época e o local em que foram produzidos, por exemplo. “A ideia era não dar a informação mastigada para que a pessoa realmente se emocione, se aprofunde na essência da obra e na emoção do momento”, diz. Gil tampouco se preparou para o projeto.

Uma vez definidos os vídeos, Lula o levou para um estúdio. Gil não sabia quais músicas seriam apresentadas.

“Eu queria pegar a primeira impressão dele ao ver um material que não via há muito tempo. Fiz algumas perguntas mais diretas, como sobre o lugar onde estava, qual a relação da composição com a música”, lembra o documentarista.

A histórica apresentação de Gil com os Mutantes no Festival da Record de 1968 para defender Domingo no parque levou o baiano, mais de 50 anos depois, a se impressionar com sua postura no palco. Gil revela que estava muito nervoso, tenso, coisa que não deixou transparecer frente às câmeras. O registro de Aquele abraço em 1983 para um especial do Chacrinha no Maracanãzinho leva Gil a revelar a inspiração para a canção: aquele abraço, segundo ele, era a frase que mais ouvia dos soldados quando esteve preso entre 1968 e 1969.

Trabalhando basicamente com material de arquivo, Lula Buarque dá tempo para que se redescubra a obra de Gil. Os vídeos são exibidos integralmente, e não apenas trechos. “O longa vai ficando mais poderoso, pois você sente o tempo passando e ele envelhecendo”, avalia o diretor, que, caso concretize o projeto de realizar um volume 2, não seguirá uma linha temporal. “Posso começar até antes de 1983 (que é quando o volume 1 termina), pois tenho liberdade para isso.”

Lula tem ainda muita intimidade com Gil, que, na Antologia, aparece sempre em planos muito fechados.

“É uma relação de confiança total. Quando fiz Pierre Verger, mensageiro entre dois mundos (1998), viajamos juntos pelo interior do Benin, ficando em hotéis de US$ 5 (a diária). Em Tempo rei, quando voltamos a Itauçu (Gil nasceu em Salvador, mas viveu até a adolescência na cidade do interior da Bahia, lugar onde não ia desde os anos 1950), ficamos em hotelzinho com banheiro no corredor. Ele não está nem aí para luxo ou conforto”, conta Lula, que tem a vontade de trabalhar outra vertente de Gil em documentário. “Queria fazer o Gil filosófico, com ele só falando, sem música. Ele é como uma enciclopédia com muitos volumes.”

Canal planeja coleção de filmes sobre bandas e artistas

Gilberto Gil – Antologia Vol. 1 integra um pacote de 40 antologias musicais que estrearão (ou já estrearam) no canal Curta!. Em 27 de janeiro, será lançado Uma garota chamada Marina, de Candé Salles. Já em 10 de fevereiro entra no ar Blitz, o filme, de Paulo Fontenelle.
Além desses, estão em desenvolvimento os longas Gonzaguinha, da maior liberdade, de Susanna Lira e Rodrigo Alzuguir; Ney Matogrosso – À flor da pele, de Felipe Nepomuceno; Todas as melodias (sobre Luiz Melodia), de Marco Abujamra; Lupicínio Rodrigues – Nervos de aço, de Alfredo Manevy; e Os Paralamas do Sucesso – Os quatro, de Paschoal Samora e Roberto Berliner.

“Entendi que era muito importante fazer uma coleção de antologias de músicos ou bandas que a juventude de hoje não tem idade para conhecer”, comenta Julio Worcman, que fundou, há sete anos, o Curta!.

O primeiro longa dessa coleção foi Barão Vermelho – Por que a gente é assim? (2016), de Mini Kerti. O Curta! reserva o horário nobre da segunda-feira (das 20h à 0h) para documentários e séries musicais.

Sancionada em 2011, a chamada Lei da TV Paga (Lei 12.485) instituiu o que ficou conhecido como canais superbrasileiros, aqueles que têm que exibir um mínimo de 12 horas de produção independente nacional por dia. O Curta! é um deles.

Quem financia a produção de conteúdo desses canais é o Fundo Setorial do Audiovisual (FSA). Constituído por tributos pagos por empresas de cinema, TV, publicidade e telefonia, o FSA é hoje o principal instrumento de fomento direto do audiovisual no país. Na terça-feira passada (17), depois de muito atraso devido à crise que atinge a Agência Nacional do Cinema (Ancine), o comitê gestor do FSA finalmente liberou R$ 703,7 milhões para a produção audiovisual.

Via FSA, foram financiados, para estrear no Curta!, 120 longas documentais e 800 episódios de 60 séries (música, artes cênicas, cinema, história e política, entre outros temas).

“Os canais superbrasileiros acabam fazendo um papel de curadoria para a produção”, afirma Worcman.

“Conquistamos um nicho incrível. Hoje, temos entre 1,5 milhão e 2 milhões de espectadores frequentes”, diz o executivo.

Parte do conteúdo do Curta! está disponível no streaming. Tamanduá (tamandua.tv.br) é uma plataforma independente voltada para filmes, séries e documentários dedicados à arte, cultura e comportamento. Os planos mensais custam a partir de R$ 13, e o aluguel individual a partir de R$ 0,90.

Com informações Estado de Minas